A questão de como o mundo seria diferente se Adão e Eva não tivessem comido o fruto proibido é profunda e complexa. Ela toca na natureza da humanidade, no caráter de Deus e no propósito da própria criação. Para explorar essa questão, devemos nos aprofundar na narrativa de Gênesis, nas implicações teológicas da Queda e na história abrangente de redenção que percorre a Bíblia.
No livro de Gênesis, encontramos o relato da criação, onde Deus cria os céus e a terra, culminando na criação da humanidade. Adão e Eva são colocados no Jardim do Éden, um paraíso onde vivem em perfeita harmonia com Deus, entre si e com o resto da criação. Eles recebem domínio sobre a terra e são instruídos a "serem fecundos, multiplicarem-se, encherem a terra e subjugá-la" (Gênesis 1:28, ESV). No entanto, eles também recebem um comando: não comer da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gênesis 2:16-17).
Quando Adão e Eva desobedecem a esse comando e comem o fruto proibido, o pecado entra no mundo. Esse ato de desobediência, frequentemente referido como "a Queda", tem consequências profundas para toda a criação. Os efeitos imediatos são a alienação de Deus, a vergonha e a introdução do sofrimento e da morte no mundo (Gênesis 3:16-19). Teologicamente, esse evento é entendido como a origem do "pecado original", uma condição que afeta toda a humanidade.
Agora, vamos imaginar um mundo onde Adão e Eva não comeram o fruto proibido. Em tal mundo, vários aspectos-chave seriam fundamentalmente diferentes:
Harmonia com Deus: No estado pré-Queda, Adão e Eva desfrutavam de um relacionamento íntimo e ininterrupto com Deus. Eles andavam com Ele no jardim e experimentavam Sua presença diretamente (Gênesis 3:8). Sem a Queda, essa comunhão com Deus teria continuado ininterrupta. A humanidade teria vivido em um estado de perfeita comunhão com seu Criador, livre das barreiras do pecado e da culpa.
Inocência e Pureza: Adão e Eva foram criados em um estado de inocência e pureza. Eles estavam nus e não sentiam vergonha (Gênesis 2:25). Sem a Queda, essa inocência teria sido preservada. Não haveria conhecimento do mal, culpa ou vergonha. A consciência humana permaneceria intocada pelo pecado.
Sem Sofrimento ou Morte: Uma das consequências mais significativas da Queda é a introdução do sofrimento e da morte no mundo. Deus diz a Adão: "Com o suor do teu rosto comerás o pão, até que voltes à terra, porque dela foste tomado; porque tu és pó, e ao pó voltarás" (Gênesis 3:19, ESV). Em um mundo sem a Queda, não haveria sofrimento, dor ou morte. O mundo natural não estaria sujeito à decadência e corrupção (Romanos 8:20-22). A vida seria caracterizada por um florescimento eterno e bem-estar.
Harmonia com a Criação: Antes da Queda, Adão e Eva receberam domínio sobre a terra e deveriam administrá-la responsavelmente (Gênesis 1:28). O relacionamento entre a humanidade e o resto da criação era de harmonia e benefício mútuo. Sem a Queda, esse relacionamento harmonioso teria continuado. Não haveria exploração ou degradação ambiental. A terra permaneceria um paraíso, repleta de vida e beleza.
Relacionamentos Humanos: A Queda introduziu conflito e discórdia nos relacionamentos humanos. Deus diz a Eva: "O teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará" (Gênesis 3:16, ESV). Em um mundo sem a Queda, os relacionamentos humanos seriam caracterizados por amor perfeito, respeito mútuo e cooperação. Não haveria ciúme, ódio ou violência. Famílias e comunidades viveriam em paz e unidade.
Sem Necessidade de Redenção: Toda a narrativa da Bíblia, de Gênesis a Apocalipse, é centrada no plano de redenção de Deus. A Queda necessitou da vinda de Jesus Cristo, o Filho de Deus, que assumiu a carne humana, viveu uma vida sem pecado, morreu na cruz e ressuscitou para vencer o pecado e a morte (João 3:16, Romanos 5:12-21). Sem a Queda, não haveria necessidade desse plano redentor. O sistema sacrificial do Antigo Testamento, as profecias de um Messias vindouro e o relato do Novo Testamento sobre a vida, morte e ressurreição de Jesus seriam desnecessários. A humanidade permaneceria em um estado de perfeita obediência e comunhão com Deus.
No entanto, embora seja intrigante imaginar tal mundo, também é importante reconhecer as limitações desse exercício. A Bíblia não fornece uma descrição detalhada do que poderia ter sido. Em vez disso, ela se concentra na realidade do mundo como ele é e na obra redentora de Deus dentro dele. A Queda, embora trágica, não é o fim da história. Ela prepara o palco para o drama da salvação, culminando na nova criação onde Deus "enxugará toda lágrima dos olhos deles, e a morte já não existirá, não haverá luto, nem choro, nem dor" (Apocalipse 21:4, ESV).
Além disso, a presença da árvore do conhecimento do bem e do mal no Jardim do Éden sugere que os seres humanos foram criados com a capacidade de escolha moral. Essa capacidade é parte integrante do que significa ser feito à imagem de Deus (Gênesis 1:27). A possibilidade de desobediência estava inerente ao dom do livre-arbítrio. Nesse sentido, a Queda não foi uma surpresa para Deus; ela fazia parte da narrativa maior através da qual Sua graça, misericórdia e amor seriam revelados.
Teólogos cristãos há muito ponderam o mistério de por que Deus permitiu que a Queda ocorresse. Alguns sugerem que foi para permitir uma demonstração maior de Seu amor e graça. Como Paulo escreve em Romanos: "onde o pecado aumentou, a graça superabundou" (Romanos 5:20, ESV). A redenção que vem através de Jesus Cristo revela a profundidade do amor de Deus de uma maneira que talvez não fosse possível em um mundo sem a Queda.
Em conclusão, embora seja fascinante considerar como o mundo poderia ter sido diferente se Adão e Eva não tivessem comido o fruto proibido, a Bíblia direciona nossa atenção para a realidade do pecado e a esperança da redenção. O mundo como o conhecemos é marcado pela quebra e pelo sofrimento, mas também é o palco para a obra redentora de Deus. Através de Jesus Cristo, temos a promessa de uma nova criação onde os efeitos da Queda serão desfeitos e voltaremos a desfrutar de perfeita comunhão com Deus. Enquanto aguardamos esse dia, somos chamados a viver à luz da graça de Deus, compartilhando as boas novas da redenção com um mundo necessitado.