Quem escreveu a Bíblia?

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A questão de quem escreveu a Bíblia é tanto complexa quanto fascinante, pois mergulha no coração da erudição bíblica e nas perspectivas de fé de milhões de crentes. De um ponto de vista cristão não denominacional, a autoria da Bíblia é entendida como uma colaboração divina-humana, onde Deus inspirou autores humanos a escrever Sua mensagem. Esta crença está enraizada nas Escrituras, que afirmam: "Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça" (2 Timóteo 3:16, NVI). No entanto, entender quem eram esses autores humanos e os processos pelos quais a Bíblia foi formada envolve uma exploração multifacetada conhecida como crítica das fontes.

A crítica das fontes é um campo da crítica bíblica que busca identificar as fontes originais que os autores bíblicos usaram para compor seus textos. Este método é particularmente pertinente aos primeiros cinco livros do Antigo Testamento, conhecidos como o Pentateuco (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio), e aos Evangelhos no Novo Testamento.

O Pentateuco e a Hipótese Documentária

Tradicionalmente, Moisés tem sido considerado o autor do Pentateuco. Esta visão é apoiada por várias referências escriturais, como as palavras de Jesus em João 5:46: "Se vocês cressem em Moisés, creriam em mim, pois ele escreveu a meu respeito." No entanto, a erudição bíblica moderna propôs que esses livros foram escritos por múltiplos autores ao longo de vários séculos. Esta teoria é conhecida como a Hipótese Documentária, que postula quatro fontes principais:

  1. Fonte J (Javista): Esta fonte é caracterizada pelo uso do nome Javé (Jeová) para Deus e acredita-se que tenha sido escrita por volta do século X a.C. durante a monarquia unida de Israel.
  2. Fonte E (Eloísta): Esta fonte usa o nome Elohim para Deus e acredita-se que tenha se originado no reino do norte de Israel no século IX a.C.
  3. Fonte D (Deuteronomista): Associada ao livro de Deuteronômio, esta fonte está ligada às reformas religiosas do rei Josias no século VII a.C.
  4. Fonte P (Sacerdotal): Esta fonte foca em questões sacerdotais, como rituais e genealogias, e acredita-se que tenha sido escrita durante o exílio babilônico no século VI a.C.

Essas fontes foram posteriormente redigidas (editadas) em uma narrativa única que temos hoje. Embora esta hipótese seja amplamente aceita nos círculos acadêmicos, ela não diminui a crença de que Deus inspirou esses textos. Em vez disso, destaca a história complexa e rica de como a palavra de Deus foi transmitida através da história humana.

Os Livros Históricos e os Profetas

Os livros históricos (Josué, Juízes, Samuel, Reis, Crônicas, Esdras e Neemias) e os livros proféticos (Isaías, Jeremias, Ezequiel e os doze profetas menores) também têm autoria diversa. Esses livros foram escritos por vários profetas, sacerdotes e escribas ao longo de vários séculos. Por exemplo, o livro de Isaías é tradicionalmente atribuído ao profeta Isaías, mas muitos estudiosos acreditam que foi escrito por múltiplos autores em diferentes períodos, comumente referidos como Primeiro Isaías (capítulos 1-39), Segundo Isaías (capítulos 40-55) e Terceiro Isaías (capítulos 56-66).

A Literatura de Sabedoria

A literatura de sabedoria, que inclui livros como Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cântico dos Cânticos, também apresenta uma variedade de autores. O rei Davi é tradicionalmente creditado com a escrita de muitos dos Salmos, enquanto seu filho Salomão é associado a Provérbios, Eclesiastes e Cântico dos Cânticos. No entanto, esses livros provavelmente incluem contribuições de outros autores e editores também.

O Novo Testamento

O Novo Testamento consiste nos Evangelhos, Atos, as Epístolas e o Apocalipse. Cada uma dessas seções tem sua própria autoria única.

Os Evangelhos

Os quatro Evangelhos—Mateus, Marcos, Lucas e João—são tradicionalmente atribuídos aos seus homônimos. Mateus e João eram apóstolos de Jesus, Marcos era companheiro de Pedro e Lucas era companheiro de Paulo. No entanto, os Evangelhos provavelmente foram escritos por comunidades cristãs primitivas que preservaram e transmitiram os ensinamentos e histórias de Jesus. Por exemplo, o Evangelho de Marcos é considerado o mais antigo, escrito por volta de 70 d.C., e acredita-se que tenha sido uma fonte para Mateus e Lucas.

As Epístolas Paulinas

O apóstolo Paulo é creditado com a escrita de treze cartas (epístolas) no Novo Testamento. Essas cartas abordam várias questões teológicas e práticas dentro das comunidades cristãs primitivas. Embora a maioria dos estudiosos concorde com a autoria de Paulo das principais epístolas como Romanos, 1 e 2 Coríntios e Gálatas, há debate sobre a autoria de outras, como Efésios e as Epístolas Pastorais (1 e 2 Timóteo, Tito).

Epístolas Gerais e Apocalipse

As Epístolas Gerais (Hebreus, Tiago, 1 e 2 Pedro, 1, 2 e 3 João, Judas) são atribuídas a vários apóstolos e líderes cristãos primitivos. A autoria de Hebreus é particularmente incerta, com sugestões variando de Paulo a Barnabé a Apolo. O livro do Apocalipse é tradicionalmente atribuído ao apóstolo João, embora alguns estudiosos argumentem que foi escrito por outro João, conhecido como João de Patmos.

Inspiração Divina e Autoria Humana

Embora a crítica das fontes forneça insights valiosos sobre os processos humanos por trás da composição da Bíblia, é crucial lembrar a doutrina da inspiração divina. Os cristãos acreditam que a Bíblia não é meramente um documento humano, mas a Palavra de Deus. O apóstolo Pedro escreve: "Antes de tudo, saibam que nenhuma profecia da Escritura surgiu de interpretação pessoal, pois jamais a profecia teve origem na vontade humana, mas homens falaram da parte de Deus, impelidos pelo Espírito Santo" (2 Pedro 1:20-21, NVI).

Esta crença na inspiração divina não nega o elemento humano na autoria da Bíblia. Em vez disso, afirma que Deus trabalhou através dos autores humanos, usando suas personalidades únicas, contextos culturais e estilos literários para transmitir Suas verdades eternas. Como o pai da igreja primitiva Agostinho de Hipona escreveu: "As Sagradas Escrituras são nossas cartas de casa" (Confissões, Livro XI, Capítulo 2). Essas "cartas" foram escritas por mãos humanas, mas carregam a mensagem divina de nosso Pai celestial.

Conclusão

Em resumo, a autoria da Bíblia é um tapete de inspiração divina e colaboração humana. Do Pentateuco aos Profetas, dos Evangelhos às Epístolas, a Bíblia foi escrita por vários autores ao longo de muitos séculos. No entanto, através de tudo isso, os cristãos acreditam que Deus estava em ação, guiando o processo e garantindo que Sua palavra fosse transmitida fielmente. Ao estudarmos a Bíblia, somos convidados a encontrar não apenas os autores humanos, mas o Deus vivo que fala através de suas palavras.

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