O termo "Gentios" na Bíblia carrega um peso significativo, particularmente no contexto do Novo Testamento e das Epístolas Paulinas. Entender quem são os gentios de acordo com a Bíblia requer uma jornada através do Antigo e do Novo Testamento, com atenção especial à relação evolutiva entre Deus e a humanidade, conforme revelado nas Escrituras.
No Antigo Testamento, o termo hebraico "goyim" é frequentemente traduzido como "nações" ou "gentios". Este termo é usado para descrever todos os povos e nações que não fazem parte de Israel. Os israelitas, ou os descendentes de Abraão, Isaac e Jacó, foram escolhidos por Deus para serem Seu povo especial, separados para cumprir Sua aliança e serem uma luz para as nações ao redor (Gênesis 12:2-3). Os gentios, portanto, eram aqueles que estavam fora desse relacionamento de aliança com Deus. Eles eram frequentemente vistos como pagãos, adoradores de falsos deuses e vivendo fora das leis morais e cerimoniais dadas a Israel.
No entanto, o Antigo Testamento também contém vislumbres do plano de Deus para os gentios. Por exemplo, o profeta Isaías fala de um tempo futuro em que os gentios virão à luz do povo de Deus (Isaías 60:3). Os Salmos também ecoam esse tema, chamando todas as nações para louvar ao Senhor (Salmo 117:1). Essas passagens sugerem um plano mais amplo e inclusivo que Deus tinha em mente, mesmo que não fosse totalmente compreendido na época.
O Novo Testamento, particularmente os escritos do apóstolo Paulo, traz esse plano em foco mais claro. Paulo, anteriormente um fariseu chamado Saulo, teve uma experiência de conversão dramática na estrada para Damasco (Atos 9:1-19). Essa experiência o transformou de um perseguidor de cristãos em um dos apóstolos mais influentes que levaria o Evangelho aos gentios. A missão de Paulo aos gentios é um tema central nos Atos dos Apóstolos e em suas epístolas.
No livro de Atos, a inclusão dos gentios na comunidade cristã primitiva é um desenvolvimento crucial. A visão de Pedro em Atos 10, onde ele vê um lençol cheio de animais impuros e ouve uma voz dizendo-lhe para comer, é uma revelação simbólica de que o Evangelho é para todas as pessoas, não apenas para os judeus. O encontro subsequente de Pedro com Cornélio, um centurião romano e gentio, reforça ainda mais esse ponto. Quando o Espírito Santo desce sobre Cornélio e sua casa, Pedro declara: "Pode alguém negar a água para que sejam batizados estes que receberam o Espírito Santo como nós?" (Atos 10:47, ESV). Este evento marca um ponto de virada significativo, demonstrando que Deus não faz acepção de pessoas e que os gentios também são destinatários de Sua graça.
As cartas de Paulo elaboram ainda mais as implicações teológicas dessa inclusão. Em sua carta aos Romanos, Paulo escreve: "Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego" (Romanos 1:16, ESV). Aqui, "grego" é frequentemente sinônimo de gentio, indicando que a salvação através de Jesus Cristo está disponível para todos, independentemente da origem étnica. Paulo enfatiza que tanto judeus quanto gentios são justificados pela fé e não pelas obras da lei (Romanos 3:28-30).
Em Efésios, Paulo fala do "mistério" que foi revelado em Cristo: "Este mistério é que os gentios são co-herdeiros, membros do mesmo corpo e participantes da promessa em Cristo Jesus através do evangelho" (Efésios 3:6, ESV). Esta ideia radical—que os gentios poderiam ser co-herdeiros com os judeus e totalmente integrados ao corpo de Cristo—foi revolucionária. Ela quebrou barreiras e preconceitos de longa data, criando um novo povo unificado de Deus.
Paulo também aborda a relação entre judeus e gentios em sua carta aos Gálatas. Ele escreve: "Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher, pois todos vocês são um em Cristo Jesus" (Gálatas 3:28, ESV). Este versículo destaca a natureza igualitária da comunidade cristã, onde todas as distinções que antes dividiam a humanidade são transcendidas em Cristo.
Teologicamente, a inclusão dos gentios pode ser vista como um cumprimento da promessa de Deus a Abraão de que "em você todas as famílias da terra serão abençoadas" (Gênesis 12:3, ESV). Paulo torna essa conexão explícita em Gálatas 3:8, onde ele afirma: "E a Escritura, prevendo que Deus justificaria os gentios pela fé, anunciou o evangelho de antemão a Abraão, dizendo: 'Em você todas as nações serão abençoadas.'" Assim, a inclusão dos gentios não é um pensamento posterior, mas uma parte do plano redentor de Deus desde o início.
O livro de Atos e as epístolas de Paulo também abordam os desafios práticos que surgiram da integração dos gentios em uma comunidade cristã predominantemente judaica. Questões como circuncisão, leis dietéticas e observância do sábado foram debatidas intensamente. O Concílio de Jerusalém, descrito em Atos 15, foi convocado para abordar essas questões. O concílio concluiu que os convertidos gentios não precisavam aderir à Lei Mosaica completa, mas foram encorajados a se abster de práticas particularmente ofensivas aos cristãos judeus, como idolatria e imoralidade sexual (Atos 15:19-20).
A carta de Paulo aos Romanos também lida com a tensão entre crentes judeus e gentios. Ele exorta ambos os grupos a aceitarem uns aos outros e a não julgarem questões discutíveis (Romanos 14:1-4). A visão de Paulo da igreja é uma onde a unidade em Cristo transcende todas as divisões culturais e étnicas, criando uma nova humanidade reconciliada com Deus e entre si.
A inclusão dos gentios também tem implicações escatológicas. Em Romanos 11, Paulo fala de um "endurecimento parcial" que veio sobre Israel até que a "plenitude dos gentios tenha entrado" (Romanos 11:25, ESV). Ele vislumbra um futuro onde todo Israel será salvo e onde a inclusão dos gentios provocará Israel à fé e ao arrependimento. Esta visão escatológica destaca a interconexão do plano de Deus para judeus e gentios.
Em resumo, os gentios, de acordo com a Bíblia, são todos os povos e nações fora de Israel. Embora inicialmente vistos como estranhos à aliança de Deus, o Novo Testamento revela uma inclusão radical dos gentios no povo de Deus através de Jesus Cristo. Esta inclusão é um cumprimento da promessa de Deus de abençoar todas as nações através de Abraão e é um tema central nos escritos de Paulo. Teologicamente, ela destaca a universalidade do Evangelho e a quebra de todas as barreiras que dividem a humanidade. Praticamente, ela desafia a igreja a viver essa unidade de uma maneira que honre tanto a herança judaica quanto a gentia, enquanto transcende divisões culturais e étnicas. A inclusão dos gentios não é apenas um desenvolvimento histórico, mas uma verdade teológica profunda que continua a moldar a identidade e a missão da igreja hoje.