Mateus 7:1-2 é uma passagem que ressoou profundamente com cristãos e não cristãos devido às suas profundas implicações nas relações interpessoais e na conduta moral. Os versículos dizem: "Não julgueis, para que não sejais julgados. Pois da mesma forma que julgardes os outros, sereis julgados, e com a medida que usardes, será medida a vós." (NVI). Esses versículos fazem parte do Sermão da Montanha de Jesus, uma coleção de ensinamentos que encapsulam a essência ética e espiritual da mensagem de Jesus.
Para entender completamente esses versículos, é essencial considerar seu contexto dentro do Sermão da Montanha. Este sermão, encontrado nos capítulos 5-7 de Mateus, é um guia abrangente para os valores e comportamentos que Jesus espera de seus seguidores. Ele aborda vários aspectos da vida, incluindo raiva, luxúria, divórcio, juramentos, retaliação, amor aos inimigos, doação aos necessitados, oração, jejum e mais. O tema predominante é o chamado a um padrão mais elevado de justiça que supera o dos fariseus e mestres da lei (Mateus 5:20).
Quando Jesus diz: "Não julgueis", Ele não está defendendo a falta de discernimento ou o abandono dos padrões morais. A palavra grega para "julgar" usada aqui é "krino", que pode significar distinguir, decidir ou condenar. Jesus está alertando contra uma atitude hipócrita, autojusta e condenatória em relação aos outros. Esse tipo de julgamento geralmente está enraizado no orgulho e na falta de autoconsciência. É o tipo de julgamento que eleva a si mesmo enquanto olha para baixo para os outros, falhando em reconhecer suas próprias falhas e deficiências.
No contexto mais amplo dos Evangelhos, Jesus frequentemente confrontou os fariseus e líderes religiosos por seus julgamentos hipócritas. Eles eram rápidos em condenar os outros enquanto negligenciavam os assuntos mais importantes da lei, como justiça, misericórdia e fidelidade (Mateus 23:23). Em Mateus 7:3-5, Jesus usa a metáfora do cisco e da trave para ilustrar o absurdo dessa hipocrisia: "Por que você repara no cisco que está no olho do seu irmão e não se dá conta da trave que está no seu próprio olho? Como você pode dizer ao seu irmão: 'Deixe-me tirar o cisco do seu olho', quando há uma trave no seu próprio olho? Hipócrita! Tire primeiro a trave do seu próprio olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão."
Jesus enfatiza a autoexaminação e a humildade antes de tentarmos corrigir os outros. Isso não significa que devemos ignorar o pecado ou o erro, mas nossa abordagem deve ser de humildade e amor, reconhecendo nossa própria necessidade de graça e perdão. O apóstolo Paulo ecoa esse sentimento em Gálatas 6:1-2: "Irmãos, se alguém for surpreendido em algum pecado, vocês que são espirituais deverão restaurá-lo com mansidão. Cuide-se, porém, cada um para que também não seja tentado. Levem os fardos pesados uns dos outros e, assim, cumpram a lei de Cristo."
O segundo versículo, "Pois da mesma forma que julgardes os outros, sereis julgados, e com a medida que usardes, será medida a vós", reforça o princípio da reciprocidade. Este princípio é encontrado em toda a Escritura e é frequentemente referido como a lei da semeadura e colheita. Em essência, a maneira como tratamos os outros acabará voltando para nós. Este é um lembrete sóbrio de que nossas atitudes e ações têm consequências. Se formos duros e implacáveis, podemos esperar receber o mesmo tratamento em troca. Por outro lado, se formos misericordiosos e compassivos, receberemos misericórdia e compaixão.
Este princípio é vividamente ilustrado na parábola do servo impiedoso em Mateus 18:21-35. Nesta parábola, um servo que é perdoado de uma dívida enorme por seu mestre se recusa a perdoar um companheiro servo de uma dívida muito menor. Quando o mestre fica sabendo disso, ele fica indignado e reinstaura a dívida original, lançando o servo impiedoso na prisão. Jesus conclui a parábola com um severo aviso: "Assim também meu Pai celestial vos tratará, a menos que perdoeis de coração a seu irmão ou irmã" (Mateus 18:35).
O chamado para abster-se de julgar e exercer misericórdia não é meramente uma diretriz moral, mas está enraizado no próprio caráter de Deus. Deus é descrito como compassivo e gracioso, lento para a ira, abundante em amor e fidelidade (Êxodo 34:6). Como seus seguidores, somos chamados a refletir seu caráter em nossas interações com os outros. O ensinamento de Jesus sobre o julgamento é um convite para incorporar a graça e a misericórdia que recebemos de Deus.
Além disso, o ensinamento de Jesus sobre o julgamento está intrinsecamente ligado ao conceito do Reino de Deus. O Reino de Deus é caracterizado por justiça, paz e alegria no Espírito Santo (Romanos 14:17). É um reino onde o amor, a misericórdia e a justiça prevalecem. Ao nos abstermos de julgamentos hipócritas e estendermos graça aos outros, participamos da manifestação do Reino de Deus na terra. Esta é a essência das Bem-aventuranças, que abrem o Sermão da Montanha: "Bem-aventurados os misericordiosos, pois eles receberão misericórdia" (Mateus 5:7).
Em termos práticos, viver o ensinamento de Jesus sobre o julgamento requer uma postura de humildade, autoconsciência e compaixão. Envolve reconhecer nossa própria necessidade de graça e estar disposto a estender essa mesma graça aos outros. Significa ser lento para condenar e rápido para perdoar, entendendo que todos nós precisamos da misericórdia de Deus. Exige uma mudança de uma mentalidade de superioridade e autojustiça para uma de empatia e solidariedade.
A literatura e a tradição cristã oferecem insights valiosos sobre este ensinamento. Por exemplo, C.S. Lewis, em seu livro "Cristianismo Puro e Simples", escreve sobre a importância da humildade e o perigo do orgulho. Ele enfatiza que a verdadeira humildade não é pensar menos de si mesmo, mas pensar menos em si mesmo. Esta perspectiva alinha-se com o chamado de Jesus para focar em nossas próprias falhas em vez de magnificar as falhas dos outros.
Dietrich Bonhoeffer, em seu livro "O Custo do Discipulado", fala sobre a importância de carregar os fardos uns dos outros e o chamado para viver em comunidade com um espírito de humildade e amor. Ele escreve: "Julgar os outros nos torna cegos, enquanto o amor é iluminador. Ao julgar os outros, cegamos a nós mesmos para o nosso próprio mal e para a graça que os outros têm tanto direito quanto nós."
Em conclusão, Mateus 7:1-2 nos chama a um padrão mais elevado de conduta interpessoal, marcado por humildade, autoconsciência e compaixão. Ele nos desafia a nos abster de julgamentos hipócritas e a estender a mesma graça e misericórdia que recebemos de Deus. Ao fazer isso, não apenas refletimos o caráter de Deus, mas também participamos da manifestação de Seu Reino na terra. Este ensinamento é um lembrete atemporal do poder da graça e do chamado para viver de uma maneira que honra a Deus e abençoa os outros.