O que significa 'cobiçar' na Bíblia?

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Cobiçar, como descrito na Bíblia, é um conceito complexo e profundamente significativo que toca os desejos humanos, a ética e a espiritualidade. Para entender o que significa cobiçar em um sentido bíblico, precisamos nos aprofundar no contexto das escrituras, examinar a língua original e explorar as implicações teológicas mais amplas.

O termo "cobiçar" aparece de forma proeminente nos Dez Mandamentos, especificamente em Êxodo 20:17:

"Não cobiçarás a casa do teu próximo. Não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o seu servo ou serva, nem o seu boi ou jumento, nem coisa alguma que pertença ao teu próximo."

A palavra hebraica usada aqui é "חָמַד" (chamad), que significa desejar, ter prazer ou deleitar-se em algo. No entanto, o contexto e o uso do mandamento indicam que este não é um desejo benigno ou inofensivo. Em vez disso, é um anseio que pode levar a ações antiéticas e à decadência espiritual.

Cobiçar, no sentido bíblico, é abrigar um desejo intenso e inadequado por algo que pertence a outra pessoa. Esse desejo vai além da mera admiração ou do desejo por bênçãos semelhantes; envolve uma insatisfação profunda com o que se tem e um anseio por possuir o que não é legitimamente seu. Esse tipo de desejo pode levar a vários pecados, pois muitas vezes surge e alimenta o ciúme, a ganância e o descontentamento.

O Novo Testamento também aborda a questão da cobiça. Em Romanos 7:7, Paulo escreve:

"Que diremos, então? A lei é pecado? De modo nenhum! No entanto, eu não teria conhecido o pecado senão pela lei. Pois eu não teria conhecido a cobiça se a lei não dissesse: 'Não cobiçarás.'"

Aqui, Paulo reconhece que a lei revela a natureza do pecado, e a cobiça é identificada como uma transgressão fundamental que expõe a natureza pecaminosa da humanidade. Cobiçar não se trata apenas do ato de tomar ou roubar; trata-se da condição interna do coração. Reflete um problema mais profundo de desejos e prioridades mal colocados.

Tiago 4:1-3 elabora ainda mais sobre a natureza destrutiva da cobiça:

"De onde vêm as guerras e contendas entre vocês? Não vêm das paixões que guerreiam dentro de vocês? Vocês cobiçam, mas não têm; matam e invejam, mas não conseguem obter o que desejam. Vocês vivem a lutar e a fazer guerras. Não têm, porque não pedem. Quando pedem, não recebem, pois pedem com motivos errados, para gastar em seus prazeres."

Tiago destaca que a cobiça leva ao conflito e à discórdia. Ela perturba relacionamentos e comunidades porque está enraizada no egoísmo e na falta de confiança na provisão de Deus. Em vez de buscar a realização através de Deus, a cobiça busca satisfação através da aquisição do que pertence aos outros.

Teologicamente, a cobiça é uma forma de idolatria. Colossenses 3:5 afirma:

"Façam morrer tudo o que pertence à natureza terrena de vocês: imoralidade sexual, impureza, paixão, maus desejos e a ganância, que é idolatria."

Aqui, a ganância e a cobiça são equiparadas à idolatria porque colocam as posses materiais e os desejos acima de Deus. Quando cobiçamos, essencialmente declaramos que a provisão de Deus é insuficiente e que precisamos de algo mais para sermos verdadeiramente satisfeitos. Essa mentalidade mina nossa fé e confiança na soberania e bondade de Deus.

A literatura e os ensinamentos cristãos há muito enfatizam os perigos da cobiça. Agostinho de Hipona, em sua obra "Confissões", discute a natureza inquieta do coração humano e como a verdadeira satisfação só pode ser encontrada em Deus. Ele escreveu famosamente: "Tu nos fizeste para ti, ó Senhor, e nosso coração está inquieto até que descanse em ti." Essa inquietação muitas vezes se manifesta na cobiça, à medida que as pessoas buscam realização em coisas que não são Deus.

Tomás de Aquino, em sua "Summa Theologica", também aborda a cobiça. Ele a categoriza sob o pecado da avareza e explica que é um desejo desordenado por bens temporais. Aquino argumenta que a cobiça é contrária à virtude da caridade, que busca o bem dos outros. A cobiça, por outro lado, busca possuir o que pertence aos outros, prejudicando assim os relacionamentos e a harmonia social.

Para combater a cobiça, a Bíblia encoraja o contentamento e a gratidão. Hebreus 13:5 aconselha:

"Conservem-se livres do amor ao dinheiro e contentem-se com o que vocês têm, porque Deus disse: 'Nunca o deixarei, nunca o abandonarei.'"

O contentamento é uma disciplina espiritual que envolve reconhecer e apreciar a provisão de Deus. Trata-se de confiar que Deus sabe o que precisamos e nos proverá de acordo com Sua vontade. Filipenses 4:11-13 fornece um testemunho poderoso de Paulo sobre este assunto:

"Não estou dizendo isso porque esteja necessitado, pois aprendi a adaptar-me a toda e qualquer circunstância. Sei o que é passar necessidade e sei o que é ter fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito ou passando necessidade. Tudo posso naquele que me fortalece."

O contentamento de Paulo está enraizado em seu relacionamento com Cristo. Ele reconhece que sua força e satisfação vêm de Cristo, não de posses materiais ou circunstâncias. Essa perspectiva é crucial para superar a cobiça, pois desloca o foco dos desejos terrenos para a realização espiritual.

Em termos práticos, cultivar a gratidão pode ajudar a combater a cobiça. Ao refletir regularmente e agradecer pelas bênçãos que temos, podemos desenvolver um coração de contentamento. A oração e a meditação na Palavra de Deus também são essenciais. O Salmo 37:4 nos encoraja a:

"Deleite-se no Senhor, e ele atenderá aos desejos do seu coração."

Quando nos deleitamos no Senhor, nossos desejos se alinham com Sua vontade, e encontramos verdadeira satisfação Nele. Esse alinhamento transforma nossos desejos de cobiçar o que os outros têm para buscar o reino e a justiça de Deus.

Em resumo, cobiçar no sentido bíblico é abrigar um desejo inadequado e intenso por algo que pertence a outra pessoa. É uma condição do coração que reflete descontentamento, egoísmo e falta de confiança na provisão de Deus. A cobiça leva a vários pecados e perturba relacionamentos e comunidades. A Bíblia nos chama a cultivar o contentamento, a gratidão e a confiança em Deus, reconhecendo que a verdadeira realização vem somente Dele. Ao alinhar nossos desejos com a vontade de Deus e nos deleitar Nele, podemos superar a tentação de cobiçar e viver em harmonia com os outros e com Deus.

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