Julgar os outros é um tópico que ressoa profundamente com muitos cristãos, pois toca no cerne de nossas interações e relacionamentos uns com os outros. A Bíblia fornece insights profundos sobre essa questão, oferecendo tanto cautela quanto orientação sobre o assunto.
No Sermão da Montanha, Jesus adverte famosamente contra julgar os outros. Em Mateus 7:1-2, Ele afirma: "Não julgueis, para que não sejais julgados. Pois da mesma forma que julgardes os outros, sereis julgados, e com a medida que usardes, também será medido a vós." Esta passagem destaca o princípio de que o julgamento é recíproco; como julgamos os outros será o padrão pelo qual nós mesmos seremos julgados. A mensagem subjacente aqui é um chamado à humildade e autoconsciência. Jesus está nos instando a reconhecer nossas próprias imperfeições antes de apontarmos os defeitos dos outros.
O contexto deste ensinamento é crucial. Jesus continua em Mateus 7:3-5: "Por que você repara no cisco que está no olho do seu irmão e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho? Como você pode dizer ao seu irmão: 'Deixe-me tirar o cisco do seu olho', quando há uma viga no seu próprio olho? Hipócrita! Tire primeiro a viga do seu próprio olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão." Aqui, Jesus não está proibindo todas as formas de julgamento, mas condenando o julgamento hipócrita e autojusto. Ele enfatiza a importância da autoexaminação e arrependimento antes de nos preocuparmos com as falhas dos outros.
O apóstolo Paulo também aborda a questão do julgamento em suas cartas. Em Romanos 2:1-3, ele escreve: "Portanto, você, que julga os outros, é indesculpável, pois está condenando a si mesmo, visto que pratica as mesmas coisas que condena. Sabemos que o julgamento de Deus contra os que praticam tais coisas é conforme a verdade. Assim, quando você, um simples ser humano, julga os outros e faz as mesmas coisas, pensa que escapará do julgamento de Deus?" A mensagem de Paulo alinha-se com o ensinamento de Jesus, destacando o perigo de julgar os outros enquanto somos culpados dos mesmos pecados. É um chamado para reconhecer nossa própria pecaminosidade e confiar na graça e misericórdia de Deus.
No entanto, a Bíblia não proíbe totalmente o julgamento. De fato, há casos em que o discernimento e o julgamento são necessários. Por exemplo, em 1 Coríntios 5:12-13, Paulo escreve: "Pois, como haveria eu de julgar os de fora da igreja? Não deveis julgar os que estão dentro? Deus julgará os de fora. 'Expulsem esse perverso do meio de vocês.'" Paulo está instruindo a igreja de Corinto a exercer julgamento dentro da comunidade de crentes para manter a pureza e santidade. Este tipo de julgamento não é sobre condenar indivíduos, mas sobre responsabilizar uns aos outros aos padrões da vida cristã.
Da mesma forma, em Gálatas 6:1, Paulo aconselha: "Irmãos, se alguém for surpreendido em algum pecado, vocês, que são espirituais, deverão restaurá-lo com mansidão. Mas cuidem-se, pois vocês também podem ser tentados." Aqui, a ênfase está na restauração e mansidão, não no julgamento severo ou condenação. O objetivo é ajudar a pessoa a retornar a um caminho justo, enquanto estamos atentos às nossas próprias vulnerabilidades.
A chave para entender o julgamento bíblico está na distinção entre julgamento condenatório e discernimento justo. O julgamento condenatório é caracterizado por uma atitude autojusta, falta de compaixão e falha em reconhecer nossas próprias falhas. Este tipo de julgamento é o que Jesus e Paulo advertem contra. Por outro lado, o discernimento justo envolve humildade, amor e um desejo pelo bem-estar espiritual dos outros. É exercido dentro do contexto de uma comunidade cristã amorosa e solidária.
Um dos exemplos mais convincentes de discernimento justo pode ser encontrado na história da mulher pega em adultério em João 8:1-11. Os fariseus trazem a mulher a Jesus, buscando armá-lo perguntando se ela deveria ser apedrejada de acordo com a Lei de Moisés. Jesus responde: "Aquele que de entre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela." Esta resposta destaca a importância da autorreflexão e do reconhecimento de nossa própria pecaminosidade antes de julgar os outros. Depois que os acusadores se vão, Jesus diz à mulher: "Nem eu te condeno. Vai-te, e não peques mais." Jesus não condona seu pecado, mas oferece-lhe graça e um chamado ao arrependimento. Esta história ilustra lindamente o equilíbrio entre verdade e graça, julgamento e misericórdia.
Na literatura cristã, C.S. Lewis fornece insights valiosos sobre a questão do julgamento em seu livro "Cristianismo Puro e Simples". Lewis escreve: "Há alguém que eu amo, embora eu não aprove o que ele faz. Há alguém que eu aceito, embora alguns de seus pensamentos e ações me revoltem. Há alguém que eu perdoo, embora ele machuque as pessoas que eu mais amo. Essa pessoa sou... eu." A reflexão de Lewis nos lembra que muitas vezes somos rápidos em julgar os outros enquanto somos lenientes conosco mesmos. É um chamado para estender a mesma graça e compreensão aos outros que desejamos para nós mesmos.
A Bíblia nos chama a um padrão mais elevado de amor e humildade em nossas interações com os outros. Em Tiago 4:11-12, somos lembrados: "Irmãos, não falem mal uns dos outros. Quem fala contra seu irmão ou julga seu irmão, fala contra a lei e a julga. Quando você julga a lei, não a está cumprindo, mas se coloca como juiz. Há apenas um Legislador e Juiz, aquele que pode salvar e destruir. Mas você, quem é você para julgar seu próximo?" Esta passagem enfatiza que o julgamento final pertence somente a Deus. Nosso papel não é usurpar a autoridade de Deus, mas viver em obediência aos Seus mandamentos, que incluem amar nossos vizinhos como a nós mesmos.
Em conclusão, a Bíblia ensina que é pecado julgar os outros de maneira hipócrita, autojusta e condenatória. Tal julgamento é contrário ao espírito de humildade, amor e graça que Deus nos chama a incorporar. No entanto, há um lugar para o discernimento justo dentro da comunidade cristã, que é exercido com humildade, amor e um desejo de restauração. Somos chamados a examinar nossos próprios corações, reconhecer nossa própria pecaminosidade e estender a mesma graça e misericórdia aos outros que recebemos de Deus. Ao fazer isso, refletimos o caráter de Cristo e construímos uma comunidade que O honra.