O jejum, como disciplina espiritual, faz parte da tradição cristã desde os primeiros dias da Igreja. É uma prática que envolve abster-se de alimentos, e às vezes de bebidas, por um período de tempo, com a intenção de focar no crescimento espiritual e buscar a presença de Deus. Embora o jejum seja uma prática significativa na Bíblia, a questão de saber se é necessário para os crentes hoje é multifacetada e requer um exame cuidadoso das Escrituras, do contexto histórico e da reflexão teológica.
A Bíblia fornece inúmeros exemplos de jejum. No Antigo Testamento, Moisés jejuou por quarenta dias e quarenta noites quando subiu ao Monte Sinai para receber os Dez Mandamentos (Êxodo 34:28). Da mesma forma, Elias jejuou por quarenta dias e quarenta noites enquanto viajava para o Monte Horebe (1 Reis 19:8). No Novo Testamento, o próprio Jesus jejuou por quarenta dias e quarenta noites no deserto antes de iniciar seu ministério público (Mateus 4:1-2). Esses exemplos destacam a importância do jejum como um meio de se aproximar de Deus e se preparar para empreendimentos espirituais significativos.
No entanto, a questão de saber se o jejum é necessário para os crentes não é explicitamente abordada na Bíblia. Não há um mandamento direto que exija o jejum para todos os cristãos. Em vez disso, o jejum é apresentado como um ato voluntário de devoção. Jesus, em seus ensinamentos, assumiu que seus seguidores jejuariam, mas ele não o ordenou. Em Mateus 6:16-18, Jesus diz: "Quando jejuarem, não mostrem uma aparência triste como os hipócritas, pois eles desfiguram o rosto para mostrar aos outros que estão jejuando. Eu lhes digo verdadeiramente que eles já receberam sua plena recompensa. Mas quando jejuarem, unjam a cabeça e lavem o rosto, para que não pareça aos outros que vocês estão jejuando, mas apenas ao seu Pai, que está em secreto; e seu Pai, que vê o que é feito em secreto, os recompensará." Aqui, Jesus usa a frase "quando jejuarem", o que implica que o jejum é uma prática comum e esperada entre seus seguidores, mas ele se concentra mais na atitude e na maneira como é feito, em vez de torná-lo uma exigência.
A Igreja primitiva também praticava o jejum. Em Atos 13:2-3, lemos sobre a igreja em Antioquia jejuando e orando antes de enviar Paulo e Barnabé em sua jornada missionária: "Enquanto adoravam o Senhor e jejuavam, o Espírito Santo disse: 'Separem-me Barnabé e Saulo para a obra a que os chamei.' Assim, depois de jejuar e orar, impuseram-lhes as mãos e os enviaram." Esta passagem indica que o jejum era uma parte integral da vida espiritual e do processo de tomada de decisões da comunidade cristã primitiva.
Apesar de sua prevalência na Bíblia e na prática cristã primitiva, o jejum não deve ser visto como uma exigência legalista, mas sim como uma disciplina espiritual que pode melhorar o relacionamento de alguém com Deus. O apóstolo Paulo aborda a questão do legalismo em Colossenses 2:16-17, onde escreve: "Portanto, não deixem que ninguém os julgue pelo que vocês comem ou bebem, ou com relação a uma festividade religiosa, uma celebração da Lua Nova ou um dia de sábado. Estas são sombras das coisas que haveriam de vir; a realidade, porém, encontra-se em Cristo." Paulo enfatiza que as práticas externas, incluindo o jejum, não são a essência de nossa fé. A realidade e a substância de nossa fé são encontradas apenas em Cristo.
O jejum, portanto, deve ser abordado com o coração e a motivação corretos. Não se trata de ganhar o favor de Deus ou provar a própria espiritualidade. Em vez disso, o jejum é uma maneira de se humilhar diante de Deus, buscar sua orientação e cultivar uma dependência mais profunda dele. Joel 2:12-13 captura bem esse sentimento: "Ainda assim, agora mesmo", declara o Senhor, "voltem para mim de todo o coração, com jejum, choro e lamento. Rasguem o coração e não as vestes. Voltem para o Senhor, seu Deus, pois ele é gracioso e compassivo, lento para a ira e abundante em amor, e se arrepende de enviar calamidade." O foco aqui está no arrependimento genuíno e no retorno sincero a Deus, com o jejum sendo um dos meios de expressar essa devoção.
Também é importante reconhecer que o jejum pode assumir diferentes formas e deve ser adaptado às circunstâncias individuais. Algumas pessoas podem ter condições de saúde que as impedem de se abster de alimentos. Nesses casos, o jejum pode ser modificado para incluir a abstenção de certos tipos de alimentos, de tecnologia ou de outras atividades que distraem do foco espiritual. A chave é a intenção por trás do jejum e o desejo de se aproximar de Deus.
A literatura cristã também oferece insights valiosos sobre a prática do jejum. Richard Foster, em sua obra clássica "Celebração da Disciplina", descreve o jejum como um meio de se banquetear com a Palavra de Deus. Ele escreve: "Mais do que qualquer outra Disciplina, o jejum revela as coisas que nos controlam. Este é um benefício maravilhoso para o verdadeiro discípulo que anseia ser transformado à imagem de Jesus Cristo. Cobrimos o que está dentro de nós com comida e outras coisas boas, mas no jejum essas coisas surgem. Se o orgulho nos controla, isso será revelado quase imediatamente. Davi escreve: 'Humilhei minha alma com jejum' (Salmo 69:10). Raiva, amargura, ciúme, contenda, medo—se estiverem dentro de nós, eles surgirão durante o jejum. No início, racionalizaremos que nossa raiva se deve à nossa fome; então perceberemos que estamos com raiva porque o espírito de raiva está dentro de nós."
A perspectiva de Foster destaca o potencial transformador do jejum. Não se trata apenas de abster-se de alimentos, mas de permitir que Deus revele e aborde as questões mais profundas dentro de nossos corações. Esse processo de autoexame e renovação espiritual é um aspecto crucial da jornada cristã.
Em conclusão, embora o jejum não seja explicitamente exigido para os crentes, é uma prática valiosa e biblicamente endossada que pode beneficiar grandemente a vida espiritual de alguém. É um ato voluntário de devoção que deve ser realizado com o coração e a motivação corretos. O jejum oferece uma oportunidade de se humilhar diante de Deus, buscar sua orientação e cultivar uma dependência mais profunda dele. É um meio de expressar arrependimento genuíno e um retorno sincero a Deus. Como tal, os crentes são encorajados a considerar a incorporação do jejum em suas disciplinas espirituais, não como uma exigência legalista, mas como uma maneira de crescer em seu relacionamento com Deus e experimentar seu poder transformador em suas vidas.